O comediante Leo Lins, condenado à pena de 8 anos e 3 meses de prisão em regime fechado por piadas proferidas em um show de stand-up, foi enquadrado pelas práticas dos crimes de discriminação contra pessoas com deficiência e preconceito racial.
O GP1 obteve, nesta quarta-feira (4), a íntegra da decisão judicial proferida pela juíza Bárbara de Lima Iseppi, da 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo.

De acordo com a sentença, o humorista praticou os seguintes crimes:
- Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (Art. 20 da Lei nº 7.719/89); e
- Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência (Art. 88 da Lei nº 13.146/2015).
Leo Lins foi denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) em virtude do conteúdo do show de stand-up “Léo Lins – Perturbador”, disponível no Youtube, que conta com 214 mil visualizações.
Declarações
Entre as declarações, a sentença destaca piadas contra negros, pessoas com deficiência, nordestinos, gordos, pessoas com HIV e outras minorias. Confira abaixo algumas afirmações:
“Sou gordo, adoro comer e não gosto de fazer exercício. Como vou emagrecer? Pegando AIDS! Cê não adora comer de tudo? Sai comendo gay sem camisinha, uma hora dá certo! Essa piada pode parecer um pouco preconceituosa”;
“O rico tenta ter filho e não consegue. Vai pro médico, faz inseminação artificial, vai pra África buscar um. Lá tem plantação. Lá você escolhe no pé! (...) Esse tá bem escurinho, vai dar like no insta!”;
“Tem gente que fala: ‘o negro não consegue arrumar emprego!’. Mas na época da escravidão já nascia empregado e também achava ruim! Aí difícil ajudar! Aliás, se o Dia da Consciência Negra é feriado pelos negros, Quarta-Feira de Cinzas devia ser judeu!”;
“Eu mando mensagem, ele não responde. Eu converso e ele não olha pra mim. É um padre artista ou um padre autista? (...) Apareceu a associação dos autistas do Brasil. Uma mãe mandou mensagem pra mim. (...) Eu falei: Vou fazer igual seu filho e te ignorar. Já tá acostumada mesmo”.
“Racismo recreativo”
No entendimento da juíza Bárbara Iseppi, as palavras do comediante em relação a pessoas negras devem ser enquadradas como “racismo recreativo”.
“O fato de se tratar de falas proferidas em contexto de ‘descontração e diversão’ consistem em causa de aumento para o crime previsto pela lei n. 7.16/89, justamente porque o legislador, com a reforma trazida pela Lei n. 14.532/2023 quis punir o chamado ‘racismo recreativo’. A leitura de parecer apresentado ao Senado Federal durante o processo legislativo da referida lei esclarece que o humor muitas vezes consiste em subterfúgio retórico para garantir impunidade relativamente a atitudes racistas”, frisou a magistrada.
Liberdade de expressão
A juíza ressaltou que o direito à liberdade de expressão “não é absoluto”. Ela destacou que, no caso do comediante Leo Lins, esse direito confronta princípios da dignidade humana.
“O exercício da liberdade de expressão não é absoluto nem ilimitado, devendo se dar em um campo de tolerância e expondo-se às restrições que emergem da própria lei sendo que, se configurar colisões com outros direitos fundamentais, deve ser interpretado, sopesado e balanceado, segundo as condições fáticas e jurídicas do caso concreto para, ao final, decidir qual deve prevalecer”, concluiu.
Pena
Além da pena de reclusão, o magistrado fixou uma multa de 1.170 salários mínimos e indenização por danos morais coletivos de R$ 303,6 mil.
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